AFETOS

12 dezembro 2017 a 17 março 2018

Paulistano, filho de pai português e mãe húngara, Edgard Rocha aportou ao Maranhão em 1971 como assistente de um filme. Três anos depois, mudou-se definitivamente para a terra, que nunca mais deixou. Ausentou-se apenas por três anos, durante a ditadura militar, quando morou na França e trabalhou com litografia no Atelier Art du Livre, da prefeitura de Paris.

Sua primeira câmera foi aquela esquecida por um fotógrafo japonês no táxi de seu pai, despertando a curiosidade do menino. Sua formação estética passeou pela escola de belas artes, pelo cinema e pelas artes gráficas, que estudou no Liceu de Artes e Ofícios e na Galeria Ca’Pesaro, em Veneza, onde chegou por intermédio dos gráficos italianos com quem trabalhava em São Paulo. Na arte ou na fotografia, seu interesse sempre esteve na incidência da luz.

Em sua longa trajetória maranhense, Edgar rodou pelo interior, registrou como ninguém o patrimônio cultural, retratou mestres em seus ofícios, sobretudo os navegadores e carpinteiros navais, recuperou imagens históricas, dialogou com as paisagens e imensidões tão presentes neste norte brasileiro.

Por seu estúdio passam muitos forasteiros, que chegam com sede de conhecer esse pedaço de Brasil ainda tão misterioso. Edgar é um grande e generoso anfitrião, nos leva a seus lugares diletos e nos contagia com seu olhar perspicaz.

Seu trabalho mostra duas características muito marcantes: a luz âmbar, morna, que nos aproxima da imagem capturada. E um fascínio pelos saberes, pelas tradições e pelo jeito de ser dos negros do Maranhão, que registra de maneira intimista e verdadeiramente amorosa.

Há muita conversa por trás de cada imagem… Seu ato fotográfico se nutre das histórias que ouve, sobretudo aquelas que denotam a sabedoria trazida pela vivência, mas também as que revelam uma visão onírica do mundo ao redor:

… a cidade que não tem anjos pois venta muito…

… o barco que deve ser feito torto, para ficar direito na água…

… o menino cego que via o vento, mas queria ver letra…

… o céu que é irmão do mar… se navega olhando para o céu mais do que tudo…

… a profundidade das águas percebida pela zoada no casco da embarcação…

… a criança que chora cedinho, em agosto de vento, avisa aos navegantes que não se deve sair para o mar…

… o mar é de todos, a terra tem dono…

 

Mais de quarenta anos passados e essa terra ainda lhe instiga e encanta.

O Maranhão de Edgar é puro afeto.

 

Paula Porta

curadora

dezembro, 2017